domingo, 8 de junho de 2014

[CRÔNICA] Ninguém quer ser invisível


No shopping, na escola, na rua, na praça, na lagoa, é sempre a mesma coisa.
Você espera na fila cheia de adultos doidos observando as lojas ao redor e crianças pulando, falando alto sobre o novo brinquedo que come e fala, que parece mais humana que todos ali, para dizer automaticamente:
"Uma casquinha mista, por favor?"
A atendente digita rapidamente seu pedido, sem olhar para você, sem olhar a máquina, sem olhar, na realidade, para nada.
Dizem que as pessoas caminham para emagrecer, outras para espairecer. Ainda não sei por qual dos dois eu ando tanto, pode ser ambos? Mas a função "espairecer" não tem funcionado muito bem. Cada vez que piso fora de casa, noto um detalhe diferente. Uma flor que brotou, o vizinho que trocou a cortina, o muro que ganhou mais uma pichação. Se foco em cada detalhe novo, mesmo que minúsculo, não consigo me desligar da humanidade. Os idosos correndo na lagoa, como se olhassem além de nós, procurando nossa almas, talvez? Os adolescentes com seus aparelhos musicais no ultimo volume tentando mostrar que está tudo certo, embora todos vejam que não está.
Essa madrugada cheguei a conclusão que ninguém está realmente ligado ao presente. Ou estão se lamentando pelo passado, ou agoniados com o futuro. As pessoas nunca estão sentindo o momento, nem se entregam por inteiro numa discussão ou debate. X% do cérebro dela está sempre dividido em suas preocupações futuristicas, no geral, um tanto fúteis e desnecessárias.
O ser humano do século 21 parece estar destinado a viver assim, ocupado com o ''talvez", se torturando pelos "e se". Ao invés de curtir cada segundo, agradecendo por ter sobrevivido á 2000 e 2012, assumiram essa forma masoquista de viver. É a conta de luz, a prova que vale 60% da sua nota final, o show daquela sua banda preferida que será no dia do aniversario da sua melhor amiga, aquele autor malvado que fica enrolando para publicar o último volume da sua coleção favorita, o dinheiro de te falta, o tempo que demora para passar, o sacrifício que não resultou em sorte até agora, aquela promessa que não sabe mais como comprimir e nem se lembra por que a fez.
Me arrancando dos pensamentos, um sorvete surge na minha frente e uma voz exausta e quase robótica fala, mais uma vez, lhe olhando como se fosse feito de vidro e pudesse ver através de você:
"Aqui está. Próximo."

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